[RESENHA] CIRCE, MADELINE MILLER.

novembro 04, 2019


Livros que tragam histórias sobre mitologias são uma grande paixão para mim. Eu já conhecia o trabalho de Madeline Miller por meio do livro A Canção de Aquiles, que nos trazia o romance homoafetivo entre Pátroclo e Aquiles. Por isto, quando li a sinopse de Circe, fiquei muito animada para saber mais desta poderosa feiticeira da Odisseia de Homero. Me vi apaixonada por ela, seus encantos, o universo mitológico e a escrita de Miller, que nos faz reviver séculos de histórias. 

SINOPSE: Na casa do grande Hélio, divindade do Sol e o mais poderoso da raça dos titãs, nasce uma menina. Circe é uma garotinha estranha: não parece ter herdado uma fração sequer do enorme poder de seu pai, muito menos da beleza estonteante de sua mãe, a ninfa Perseis. Deslocada entre deuses e seus pares, os titãs, Circe procura companhia no mundo dos homens, onde enfim descobre possuir o poder da feitiçaria, sendo capaz de transformar seus rivais em monstros e de aterrorizar os próprios deuses. Sentindo-se ameaçado, Zeus decide bani-la a uma ilha deserta, onde Circe aprimora suas habilidades de bruxa, domando perigosas feras e cruzando caminho com as mais famosas figuras de toda a mitologia grega: o engenhoso Dédalo e Ícaro, seu filho imprudente, a sanguinária Medeia, o terrível Minotauro e, é claro, Odisseu. E os perigos são muitos para uma mulher condenada a viver sozinha em uma ilha isolada. Para proteger o que mais ama, Circe deverá usar toda a sua força e decidir, de uma vez por todas, se pertence ao reino dos deuses ou ao dos mortais que ela aprendeu a amar. Personagens vívidos e extremamente cativantes, aliados a uma linguagem fascinante e um suspense de tirar o fôlego, fazem de Circe um triunfo da ficção, um épico repleto de dramas familiares, intrigas palacianas, amor e perda. Acima de tudo, é uma celebração da força indomável de uma mulher em meio a um mundo comandado pelos homens.

Na mitologia grega, Circe é filha de Hélio, Deus do Sol. É ligada a feitiçaria, sendo considerada a Deusa da Lua Nova, do amor físico, feitiçaria, encantamentos, sonhos precognitivos, maldições, vinganças, magia negra, bruxaria e caldeirões. Existem outras retratações que a fazem ser filha da ninfa Perseis (como optado por Miller) e outros por Hécate, deusa das terras selvagens e dos partos. 

Na Odisseia, vemos o herói Ulisses e seus homens desembarcar na ilha de Circe em busca de hospitalidade. A princípio, parece um local sem qualquer indicação de habitação, porém, ao se aproximarem do palácio da Deusa, percebem como estavam errados, principalmente ao notarem que estava rodeados de animais selvagens domados pelos poderes de Circe. Após um momento de confusão, quando tentam atacar a deusa, a tripulação de Ulisses é transformada em porcos. O herói, que era rei de Ítaca, estava sob influencia de uma planta chamada Moli, que o tornava imune aos poderes de Circe. Deste modo, conseguiu fazê-la reverter o feitiço sob a mira de sua espada. Um outro relato por meio do Poema Metamorfoses, também utilizado por Miller e escrito por Ovídio, aborda a história de Circe, Glauco e Cila, sobre como a ira pelo amor não-correspondido transformou uma mulher em um dos grandes monstros das histórias gregas. Em minha opinião, é uma das mais significativas relacionadas a Circe.

A parte mais incrível deste livro é a forma autônoma com que a personagem conta sua história. Aqui ela é sua própria voz. A humanização nos faz enxergá-la através da névoa do sangue e poder que carrega. Nesta obra, Circe é uma menina que aprendeu a viver nas sombras, desenvolveu seu poder como única forma de sobrevivência e a partir dos obstáculos impostos por seus familiares, se descobriu uma mulher forte, destemida, que erra e acerta na mesma medida e que tem muito a nos contar sobre suas vivências. 

Em uma entrevista, a autora diz que queria criar um épico sob a visão de uma mulher. E escolheu Circe. "Queria que o romance se baseasse na experiência de uma mulher. Deuses e monstros à parte, esta é a história de uma mulher que atinge a maioridade e entra em seu poder.". Levou sete anos para finalizar tudo e hoje se diz satisfeita com o resultado. "Eu queria criar um novo mito, um novo épico especificamente, já que a vida das mulheres tradicionalmente não é considerada importante o suficiente para o épico. A poesia épica sempre se concentra em histórias tradicionalmente masculinas, guerra, herança, morte. Mas uma das coisas mais épicas que posso imaginar é o nascimento - que foi excluído da poesia épica por ser tradicionalmente feminina".

"Humilhar mulheres parece ser um dos passatempos preferidos dos poetas. Como se não pudesse haver uma história se não rastejarmos e choramingarmos."

Sempre me incomodou o fato das mulheres serem, de alguma forma, apagadas da mitologia e transformadas em possíveis vilãs, destruidoras de lares e perversas influências aos homens. Acho que quando percebemos a importância da representatividade delas em suas história é que iremos sentir a relevância de um livro como Circe. Foi riquíssimo ver esta personagem amadurecer ao longo da narrativa que em nenhum momento se torna prolixa. 

Um livro que carrega em si uma excelente construção de mundo e personagens com sua carga de complexidade. A mitologia é respeitada, mas sem deixar de mostrar suas mulheres. Circe, uma feiticeira, se transforma em uma mulher magnifica que você precisa se deixar conhecer. Um livro que me surpreendeu mais do que esperava. Deixo aqui também minha parabenização pelo excelente trabalho de revisão, tradução e diagramação por parte da editora Planeta Minotauro. 

"Era assim que os mortais encontravam a fama, pensei. Por meio de prática e diligência, cuidando de suas habilidades como jardins até brilharem sob o sol. Mas deuses são nascidos de icor e néctar, sua excelência já explodindo da ponta dos dedos. Então encontram fama provando o que podem avariar: destruindo cidades, começando guerras, gerando pragas e monstros. Toda aquela fumaça e sabor erguendo-se tão delicadamente de nossos altares – ela deixa apenas cinzas para trás." 

ADQUIRA SEU EXEMPLAR: 
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OBSERVAÇÃO: 
Caso queria ouvir músicas enquanto estiver lendo, preparei uma playlist bem especial em homenagem ao livro. Para escutar, clique aqui.


Seu outro livro (que vale a pena conhecer):

A canção de Aquiles, editora Jangada: Baseada na Ilíada, esta obra é uma reconstituição da épica Guerra de Troia. O tímido príncipe Pátroclo é exilado no reino de Fítia, onde cresce à sombra do rei Peleu e de seu extraordinário filho, Aquiles. Apesar de suas diferenças, os meninos logo se tornam companheiros inseparáveis. Os laços entre eles se aprofundam à medida que se tornam adolescentes e hábeis nas artes da guerra e da medicina - para desagrado e irritação da mãe de Aquiles, Tétis, uma cruel deusa marinha que odeia os mortais. Quando se espalha a notícia de que Helena de Esparta foi raptada, os homens da Grécia, ligados por um juramento de sangue, têm de partir para invadir Troia e salvar Helena. Seduzido pela promessa de um destino glorioso, Aquiles junta-se à causa. Pátroclo, dividido entre o afeto e o temor por seu amigo, acompanha-o. Mal sabem eles que os deuses do destino os colocarão à prova como nunca antes, exigindo deles um terrível sacrifício.

SOBRE A AUTORA: Madeline Miller é uma escritora, professora e dramaturga norte-americana. Seu primeiro livro, A canção de Aquiles, levou dez anos para ser finalizado, enquanto Madeline era professora de latim e grego e por ele Madeline ganhou o Orange Prize for Fiction. 

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