[CLÁSSICOS] 5 LIVROS DE VIRGINIA WOOLF.

setembro 04, 2020

Tenho uma relação um tanto complexa com Virginia Woolf, pois me identifico com boa parte de seu repertório, em particular com sua primeira obra, A Viagem, lançada em 1915. Nela, percebemos traços pessoais da vida da autora, que foi marcada por muitas perdas e tormentos, que cessaram de forma trágica em 1941, quando Woolf jogou-se no rio Ouse, deixando duas cartas (para seu marido e irmã) e diversas obras que são reconhecidas como importantes para a literatura e história mundial. Abaixo, selecionei alguns títulos que considero importantes para começar a desbravar a escrita desta autora que sempre esteve engajada na defensa dos direitos das mulheres.

1. MRS. DALLOWAY

Este é um dos livros mais conhecidos da autora, publicado em 14 de maio de 1925. Nele, acompanhamos um dia da socialite Clarissa Dalloway, numa Inglaterra marcada pelo fim da Primeira Guerra Mundial. Uma das coisas que mais amo nesta obra é a sensibilidade e a perspicácia da autora em abordar o estresse pós-traumático com o personagem Septimus Smit (que muitos consideram ser um alter ego de Virginia), um ex-combatente que precisou se adaptar a sua "vida normal", tendo que lidar com uma saúde mental extremamente debilitada. Além disso, o suicídio e as reflexões sobre como vivemos nossas vidas também são apresentados, mesmo que a história nos mostre apenas um fragmento do cotidiano de Dalloway. Existem alguns pensamentos de Clarissa que são interessantes (e um tanto incômodos) de entender, como sua recusa em envelhecer por achar que viveu pouco, bem como sua trajetória enquanto mulher, esposa e mãe, apesar de existir momentos que podem parecer mesquinhos, especialmente quando adentramos na história de Septimus e de toda sua luta pessoal. É um livro que considero difícil de ler pelo fluxo de consciência da personagem, além da complexidade dos temas explorados. Por isso, recomendo que a leitura seja feita com muita atenção, até vale deixar um bloquinho de anotações e uma caneta por perto. Uma das edições que adoro é a da editora L&PM, que traz uma introdução necessária. Obra ímpar e que merece sua atenção! 

PARA SABER MAIS:

2. UM TETO TODO SEU 

Durante meus estudos para compreender a história do feminismo, Um teto todo seu foi uma das leituras que mais recebi indicação como "obrigatória", pois é considerado um ensaio feminista de qualidade e atemporal. Lançado em 1929, o livro apresenta o ponto de vista de Woolf sobre mulheres na ficção, baseado em suas palestras para mulheres universitárias. Na edição da Tordesilhas Livros, existem alguns conteúdos extras: uma seleção de trechos dos diários de Virginia, uma cronologia da vida e da obra da autora e um posfácio escrito pela crítica literária e colaboradora da Folha de S. Paulo, Noemi Jaffe. As reflexões sobre o patriarcado, as condições trabalhistas e a produção literária para as mulheres é de uma sabedoria quase assombrosa, especialmente ao analisar o contexto sociocultural que o texto foi escrito e seus reflexões nos dias atuais. Aquela leitura que vale como introdução para muitas pesquisas e ponderações importantes. 

"As mulheres têm servido há séculos como espelhos, com poderes mágicos e deliciosos de refletir a figura do homem com o dobro do tamanho natural. Sem esse poder, provavelmente a terra ainda seria pântanos e selvas. As glórias de todas as nossas guerras seriam desconhecidas. O tsar e o cáiser nunca teriam usado coroa nem a teriam perdido. Seja qual for o uso nas sociedades civilizadas, os espelhos são essenciais para todas as ações violentas e heroicas. É por isso que tanto Napoleão quanto Mussolini insistiam tão enfaticamente na inferioridade das mulheres, pois, se eles não fossem inferiores, eles deixariam de crescer."

PARA SABER MAIS: 

3. AO FAROL 

Fazendo parte de uma tríade composta pelas obras Mrs. Dalloway e As Ondas, foi publicada em 1927.  A história apresenta traços filosóficos vistos em obras de escritores clássicos como James Joyce, autor de Ulisses. Um detalhe bacana: é inspirada em lembranças de Woolf, mais especificamente de suas férias de verão na casa de praia da família em St Ives. Nesta época, com seus 13 anos, perdeu sua mãe, com quem mantinha uma boa e amorosa relação. Assim, passou a conviver com seu pai e irmãos, sendo que a relação paternal era um tanto conturbada, apesar dele amar seus filhos. Mesmo com toda esta contextualização, este romance nos apresenta a história da família Ramsay, que trata de relações familiares em um fluxo de consciência intenso e rico em detalhes. Com toda a sua complexidade, melancolia e poesia que somente Woolf poderia escrever, é uma de suas melhores obras, notadamente pela forma com que cria seus diálogos e desenvolve sua narrativa. 

Pequena sinopse do livro: Sra. Ramsay, uma mulher maternal e serena; sr. Ramsay, um renomado e árido filósofo; os filhos e criados do casal; Lily, amiga da família. Todos estão passando o verão na Ilha de Skye, na Escócia. James Ramsay, de seis anos, anseia por um prometido passeio ao farol da ilha, enquanto recorta figuras na companhia da mãe. A partir dessa cena, construindo uma narrativa em dois momentos, 1910 e 1920 – antes e depois da guerra que assolaria a Europa –, Virginia Woolf escreveu um dos mais influentes romances do século XX.

PARA SABER MAIS:

4. ORLANDO: UMA BIOGRAFIA 

A história de amor entre Virginia Woolf e Vita Sackville-West, escritora talentosa e responsável pelo poema The Land, pode ser recontada por meio de cartas trocadas em meio a seus respectivos casamentos e carreiras. Em cada palavra lida, percebe-se que o sentimento entre ambas era recíproco, apesar de reconhecerem a situação terrível com que precisavam lidar. Virginia era cônjuge de Leonard Woolf, com que esteve junto até o dia de sua morte. Em uma carta de despedida (uma das mais tristes que já li), conta que amou o marido e que agradece pelo tempo que viveram juntos, apesar dos relacionamentos extraconjugais homoafetivos que teve ao longo da vida, especialmente com Vita. Como forma de homenagear a amiga, amante e confidente, Woolf cria uma obra divertida, diferente e ainda complexa, que descrita pela própria autora, pode ser considera “uma escapadela depois desses livros sérios de experimentação poética, tão exigentes em matéria de forma”. 

No livro, acompanhamos quatro séculos de vida do personagem Orlando, que num certo dia, ao acordar, percebe que uma mulher imortal está em seu corpo. Começando com seus 16 anos e ficando durante boa parte em seus 30 anos, a história nos conta como o personagem viveu seus 350 anos. O livro também satiriza a sociedade inglesa, de forma sagaz e até mesmo ousada (em minha opinião). A maneira como Woolf lida com o tempo e como aborda a questão de gênero, são o que chamam atenção na obra, especialmente pela mudança (positiva) na escrita da autora. Considerada uma das leituras mais importantes da história, teve sua adaptação literária em 1992, com a atriz Tilda Swinton como Orlando. 

PARA SABER MAIS:

5. AS ONDAS 

Esta é uma das obra mais profundas de Virginia e acredito que isto se deve aos solilóquios (monólogos longos de apenas um personagem/enunciador) dos seis personagens da obra: Bernard, Susan, Rhoda, Neville, Jinny e Louis. Publicado em 1931, a história nos conta um dia na vida destes personagens, que para alguns estudiosos e até de informações retiradas dos diários de Woolf, são pensamentos e reflexões que podem ser lidos separadamente mas representam um pensamento coletivo. Um tanto complexo, certo? 

Dividido em 9 seções, cada uma delas nos mostra um momento na vida deles (infância, juventude, vida adulta e velhice), e o mais bacana é perceber que existe um sétimo personagem (Percival) que mesmo não tendo seu momento de aparição, pode ser conhecido em detalhes a partir do ponto de vista dos outros personagens. É muito interessante ser conduzido ao longo dos caminhos percorridos por estes amigos de infância, com alusões ao tempo e a natureza, enquanto vivenciam traições, amores e outras emoções ao longo de suas vidas. Eu acredito que a leitura possa ser confusa por conta da escrita da autora, o que de fato condiz com o título da obra: um vai e vem como ondas, com fluxos fortes e que nos fisgam do início ao fim. 

PARA SABER MAIS:
(encontrei a edição do livro apenas neste box, que pode ser lido pelo Kindle Unlimited)

OUTROS LIVROS DA AUTORA:

Entre os Atos (1941)
A viagem (1915)
Encontrados entre os papéis (1972)
O sol e o peixe (1928)
O quarto de Jacó (1922)
Três guinéus (1938)
Noite e Dia (1919)
Os Anos (1937)
Flush: Uma Biografia (1933)

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